22 de outubro de 2010

No reino da estupidez

Esta semana viajei para norte. Levou-me o percurso pelo litoral - visitando paisagens magníficas como as da Nazaré e da Costa Nova em Aveiro - e ao contacto com a mais recente originalidade portuguesa, saída da mente brilhante do bando que nos tem governado nos últimos anos: as portagens electrónicas das Scuts.

Ora, viajando em moto emprestada (mas podia ser em carro alugado, por exemplo...) e tentando sair de Aveiro para o Porto, a única solução foi seguir pela estrada nacional uma vez que, como é sabido, para se poder ser cobrado nas portagens electrónicas é necessário ser assinante da Via Verde ou comprar o dispositivo electrónico que foi colocado à venda especificamente para o efeito.

Há várias questões a considerar aqui. A primeira é que, em meu entender, as vias rápidas (auto-estradas ou similares) são eixos fundamentais para o desenvolvimento económico do país e, como tal, não deviam ter portagens. É assim com as auto-vias em Espanha, por exemplo, é assim em Inglaterra com todas as auto-estradas, é assim na Alemanha. O princípio do utilizador-pagador (um argumento utilizado com malícia, pois pretende convencer os não utilizadores da justiça da medida), não se pode aplicar; como não se pode (não se devia) aplicar à saúde pública e à educação. Afinal de contas, é para garantir estas estruturas e serviços que são pagos impostos, muito embora os nossos governantes achem que os impostos servem apenas para engordar os próprios, os seus aparelhos partidários e respectivas clientelas.

Por falar em clientelas. O plano inicial não era este. Lembram-se? Era o de "chipar" as matrículas de todos os veículos, matando de uma só cajadada, dois anafados coelhos: por um lado garantia um controlo absoluto sobre o movimento dos cidadãos, podendo o Estado aplicar-lhe as coimas, as taxas e as portagens que quisesse sem que este pudesse sequer intervir. Logo que pegasse no seu veículo e se deslocasse, o cidadão estava em "linha directa" com o fisco, a polícia ou com quem muito bem o Estado entendesse; por outro lado, o "compadre" que ficasse encarregue de fabricar os "chips" - certamente por adjudicação directa ou "concurso controlado" - ganharia fortunas, cujas "comissões" seriam devidamente pagas às pessoas certas e à sede do partido benfeitor.

A celeuma, a mais que evidente inconstitucionalidade (não que isso, nos dias de hoje, perturbe demasiado quem governa) puseram um freio na manobra, substituindo-a pela compra do dispositivo. Os pórticos foram instalados e as portagens passaram a ser cobradas.

Como resultado deste facto, as vias que anteriormente eram de acesso livre, passaram a ser exclusivas dos portadores de identificador electrónico. Se eu quiser utilizar essa via, numa situação como a que foi descrita no início do texto, não posso. Ou seja, uma via construída com o dinheiro dos meus impostos é-me agora vedada. Parece-me evidente que esta situação fere profundamente a constituição que garante direitos iguais para todos.

Como resultado desta alucinação, as estradas nacionais - abandonadas durante anos - degradadas e/ou sobrepovoadas, passaram a ser utilizadas por um número muito maior de veículos; lentamente, arrastando-se através de aldeias, vilas, rotundas, semáforos, passadeiras que foram plantadas de 20 em 20 metros nalgumas localidades... um inferno!!! Para quem tem que percorrê-las e para quem em redor delas vive. Percursos que se faziam na Scut em minutos, levam agora horas. A sinistralidade vai aumentar (principalmente peões) e com ela o caos. E ainda não chegou o Inverno...

A última "filhadaputice" de toda esta vergonha é o duro golpe que vai constituir para a economia das regiões afectadas. O transporte de mercadorias de, para e através das terras que receberam esta "prenda" do Socratismo vai "derivar" para outros locais, onde se possa chegar melhor, mais rápido, de forma mais prática e mais barata.

Como dizia um amigo, é incrível ao que se chegou com isto, prejudicando tantos, apenas para o benefício de alguns: os que "inventaram" estas portagens electrónicas.

2 comentários:

  1. Não obstante a citada "filhadaputice" de cobrança de portagens nas vias SemCustosParaUtilizador, construídas com verbas comunitárias destinadas para o efeito "literal", é preciso ressalvar que, quem não possui o DEM ou a ViaVerde, pode circular nas referidas estradas, devendo dirigir-se a uma estação dos CTT nos 10 dias que se seguem à passagem nos pórticos a fim de proceder ao pagamento das respectivas taxas, acrescidas de uma taxa de serviço de 0,25€. Não deixa de ser uma barbaridade mas facilita ligeiramente.

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  2. Trata-se de um mero subterfúgio legal que permite ter uma saída viável para quem, por exemplo, entra na via por engano. Não mais que isso.

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